domingo, 16 de maio de 2010

Primeira Epístola de São João

Sobre o suposto adendo à Epístola de São João que Dragó refere-se no post anterior encontrei essa resposta da Comissão de Tradução da Sociedade Bíblica do Brasil. Correspondência retirada daqui:


São João Evangelista nos traços de
Gianni de Luca.
"Recebemos mensagem eletrônica [...] argüindo-nos acerca do motivo por que algumas palavras de 1João 5.7-8 aparecem entre colchetes na tradução de Almeida Revista e Atualizada.
 
Sobre esta questão, precisamos compreender o significado dos colchetes na RA. Isto aprendemos ao ler no artigo "Explicação de Formas Gráficas Especiais, Títulos, Referências e Notas", adendo ao "Prefácio à 2a. Edição": algumas passagens do Novo Testamento aparecem entre colchetes. Estas passagens não se encontram no texto grego adotado pela Comissão Revisora, mas haviam sido incluídas por Almeida com base no texto grego disponível na época (Mt 6.13).
 
Almeida traduziu a Bíblia para a Língua Portuguesa no século XVII. O Novo Testamento em português ficou pronto em 1681. Almeida traduziu-o a partir de um texto grego denominado Textus Receptus ("o texto recebido"), que fora compilado pelo famoso humanista holandês Erasmo de Roterdã no início do século XVI. A tradução de Almeida a partir dos manuscritos que ele possuía em sua época cristalizou-se na chamada Edição Revista e Corrigida (RC), publicada pela Sociedade Bíblica do Brasil e adotada por inúmeras denominações evangélicas em países de fala portuguesa, destacando-se Portugal e Brasil. A RC espelha bem o teor do Textus Receptus utilizado por Almeida.
 
João Ferreira de Almeida
Quando a tradução de Almeida já estava concluída, Deus permitiu que arqueólogos, historiadores e teólogos verificassem um considerável avanço no achado, recuperação e decifração de manuscritos bíblicos, alguns dos quais indisponíveis a Almeida na época em que traduziu a Bíblia. A Edição Revista e Atualizada (RA) surgiu em 1956 em decorrência dessas novas descobertas, quando a Comissão Revisora da Sociedade Bíblica do Brasil achou por bem confrontar o texto de Almeida com os novos manuscritos encontrados. A RA passou por uma segunda revisão em 1993, afinando ainda mais o texto bíblico aos textos originais em hebraico, aramaico e grego, pelo que é uma das mais amadas e adotadas traduções da Bíblia Sagrada no Brasil e no exterior.
 
Dito isto, fica um pouco mais simples compreender a diferença de tratamento dado àquelas palavras de 1João 5.7-8 na RC e na RA. Na primeira - que corresponde à tradução mais antiga de Almeida - as palavras "no céu: o Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um. E três são os que testificam na terra" constavam do texto original grego utilizado pelo tradutor. Já na RA, confrontando-se a tradução de Almeida com os manuscritos encontrados (mais antigo e, portanto, mais próximos do tempo em que João escreveu sua primeira carta) e desde que as referidas palavras não contradizem nem ofendem a mensagem bíblica da salvação em Cristo Jesus, estas palavras foram colocadas entre colchetes. Com isto, a RA respeitou o trabalho valioso de João Ferreira de Almeida, sem, contudo, ter aberto mão da fidelidade ao melhor texto original grego a que se tem acesso nos dias atuais.
 
(Nas traduções desenvolvidas pela própria Comissão de Tradução da Sociedade Bíblica do Brasil, todavia, como é o caso da Bíblia na Linguagem de Hoje, as palavras questionadas de 1Jo 5.7-9 foram eliminadas por completo do texto bíblico).
 
Por fim, acerca da procedência da palavras questionadas de 1Jo 5.7-8, convém mencionar a opinião do Dr. Bruce Metzger, uma das maiores autoridades atuais sobre os manuscritos gregos do Novo Testamento, que coopera com as Sociedades Bíblicas Unidas, a fraternidade da qual a Sociedade Bíblica do Brasil faz parte. Conforme o Dr. Metzger, todos os manuscritos gregos mais antigos do Novo Testamento (datados dos séculos II e III) omitem as palavras "no céu: o Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um. E três são os que testificam na terra" em 1Jo 5.7-8. Estas palavras só começaram a aparecer em comentários e sermões sobre o texto de 1João no final do século IV e, muito posteriormente, em um manuscrito latino do século XIII. Segundo o Dr. Metzger, as palavras aqui em questão podem ter sido o comentário que um copista (pessoa encarregada de copiar a Bíblia na Idade Média) fez na margem do pergaminho em que trabalhava; um copista posterior, ao tomar o manuscrito mencionado como texto base para sua cópia, incorporou o comentário marginal do seu outro colega ao texto bíblico, erro que mais recentemente foi descoberto sem grandes dificuldades pela comparação dos manuscritos mais recentes com os mais antigos.
 
Sendo isto para o momento, agradecemos muitíssimo sua paciência e atenção. A Sociedade Bíblica do Brasil faz votos de que o irmão continue sendo um leitor fiel e dedicado da Palavra do Senhor, fonte de orientação e consolo eternos. 
 
Cordialmente em Cristo,"
 
p/ Comissão de Tradução
Sociedade Bíblica do Brasil

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